Desenvolvimento Urbano e Segregação


Vereadora Elaine do Quilombo Periférico questiona as diretrizes propostas pela prefeitura na revisão operação urbana Água Branca

A mesa diretora e a liderança do governo na câmara aprovaram nesta quarta-feira, dia 2 de junho a revisão da Operação Urbana Consorciada Água Branca. Entre os pontos mais polêmicos da proposta apresentada pelo executivo municipal está a redução dos valores cobrados pelos Certificados de Potencial Adicional de Construção – Cepacs.

Hoje esses certificados estão avaliados em R$ 1,4 mil para imóveis residenciais e R$ 1,6 mil para imóveis comerciais. O valor inicial proposto pela atual gestão é que os Cepacs da operação Água Branca sejam leiloados pela metade dos valores. Na última hora o governo acatou uma proposta da oposição e estabeleceu que os valores dos Cepacs ficariam em torno de R$ 1,100 para os imóveis comerciais e R$ 900 para os residências.

O que fica evidente de cara na proposta é que os valores arrecadados pelo município na operação, que serviriam para financiar uma série de intervenções urbanas na região,  a começar pela construção de Habitações de interesse Social – HIS, passando por equipamentos públicos como escolas, postos de saúde, creches entre outras, já ficam prejudicados, uma vez que o potencial de arrecadação com a operação não cobre nem uma parcela das 5 mil unidades habitacionais previstas no plano.

Além disso, o plano inicial prévia 10 creches, seis escolas e três postos de saúde, com essa redução surge a questão: de onde o município pretende tirar os valores para executar a implantação desses equipamentos?

Método acelerado de revisão

O método de realizar todos os debates previsto em pouco mais de uma semana, causou grande desconforto entre os vereadores que entendem se tratar de um assunto complexo para se tratar assim a toque de caixa. Inclusive com questionamentos de parlamentares da base governista.

Desenvolvimento para quem?

Na última quarta-feira, dia 26 de maio, a vereadora Elaine do Quilombo Periférico, falou sobre os problemas relacionados a esse método que desvaloriza o debate em um projeto que atingirá milhares de pessoas por décadas.

Elaine destacou a brutalidade e o racismo que estão por trás da grande marcha ao desenvolvimento e riqueza de São Paulo: “Entretanto, o que se oculta nessa mitologia é parte dos assassinatos, da escravização, da exploração e expropriação de índios e negros que sempre contou com a associação do poder público”. Somado a isso ressaltou que hoje temos mais conhecimento disso graças a atuação dos movimentos sociais.

Chamou a atenção dos vereadores e do papel que cada um cumpre ao exercer o mandato e o compromisso com o enfrentamento a injustiças sociais. “Se o objetivo de nós vereadores é enfrentar as injustiças sociais e o racismo, é bom nos preocuparmos com isso. Porque como dezenas e dezenas de dados e estudos demonstram, a história de dominação racial e de opressão da população negra e indígena para extrair mais riqueza não parou com a abolição, apenas sofrem constantes atualizações para permanecerem vivas”.

Em seu discurso Elaine destaca que para além das diversas incoerências que as operações urbanas carregam já na sua origem que privilegia um projeto liberal em detrimento de avanços sociais nde territórios, a marca mais evidente que elas deixam é a expulsão de pessoas de suas casas. “A história da cidade de São Paulo é marcada por planos de desenvolvimento urbano e esses planos de desenvolvimento sempre têm constituído em um eixo central: expulsar a população periférica, especialmente negra, de seus territórios. Apagar sua história, e banir as pessoas e enriquecer alguns poucos a partir disso”.

Um dos pontos mais importantes de sua abordagem Elaine questiona o sobre o desenvolvimento proposto pelas operações urbanas e lembra que historicamente os planos de desenvolvimento têm servido para banir e segregar a cidade. “Foi a mesma promessa feita em planos de modernização do fim do século XIVIII começo do século XX que  resultou na expulsão das populações negras do centro da cidade. Depois da década de 70 com programas de financiamento voltado às classes médias e esqueceram por completo as classes mais pobres, obrigando-as a se resolverem pela autoconstrução em áreas longínquas e sem infraestrutura”, destaca a parlamentar.

Elaine também cobra que as intervenções sociais previstas pela operação e traz a memória a falta de um estudo sobre o impacto cultural e histórico da região que leve em consideração a necessidade de preservação de territórios pretos identificados em um levantamento preliminar da feito pela assessoria da bancada do PSOL. Esse levantamento apontou que no perímetro existem 12 escolas de samba, 12 escolas de capoeira e 15 terreiros de religiões de matriz africana. Esses territórios estão distribuídos em áreas públicas e privadas.

Entre muitas outras questões a mandata coletiva Quilombo Periférico, questiona: pra quem é esse desenvolvimento que estão propondo? “O desenvolvimento que se dá apenas sobre o solo, não é desenvolvimento nenhum. Desenvolvimento tem que se referir à pessoas. Desenvolvimento que diz respeito apenas à obras grandiosas e capital especulativo é o desenvolvimento que não nos interessa e não deveria interessar a ninguém, pois está levando a humanidade à extinção”, conclui a parlamentar.

A lentidão para construir moradia popular contrasta com a velocidade espantosa para tirar as pessoas de suas casas, como ocorreu com as famílias da Favela do Sapo e da Aldeinha, entre 2007 e 2011 e que aguardam até hoje por habitação. A velocidade com que correram os empreendimentos imobiliários de moradia de alto padrão que deram muito lucro, com um salto gigantesco de embranquecimento da área é espantosa. “Em resumo preto sai para branco chegar. Pobre sem casa, ricos tomando sol na varanda. E tudo isso não se dá por uma intervenção divina que quis assim, mas pelo conjunto de ações e omissões do poder público”, destaca Elaine.

Operações Urbanas Consorciadas

Há regiões da cidade, como o entorno das avenidas Faria Lima e Água Espraiada, os distritos Sé e República da região central e a Várzea do rio Tamanduateí, em que a Prefeitura identificou grande potencial de desenvolvimento urbano. Nessas áreas o poder público pretende viabilizar obras de infraestrutura urbana e incentivar investimentos do setor privado. Essas regiões são delimitadas em determinado perímetro e denominadas Operações Urbanas Consorciadas (OUC) ou Áreas de Intervenção Urbana (AIU). Elas possuem regras específicas que as destacam na lei de zoneamento geral da cidade.

Para o proprietário de um terreno localizado dentro de uma dessas regiões construir acima do coeficiente mínimo, deve comprar Certificados de Potencial Adicional de Construção (Cepac). Para cada Operação Urbana Consorciada a Prefeitura leiloa, pelo Bovespa, determinado número de Cepacs; os valores são corrigidos pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM). O dinheiro que a gestão municipal arrecada na emissão de Cepacs no mercado é revertido para o Fundurb. A emissão de novas Cepacs ocorre de acordo com o nível de desenvolvimento das operações urbanas. Qualquer cidadão pode adquirir e vender as Cepacs no mercado financeiro. Atualmente, a cidade de São Paulo tem quatro Operações Urbanas Consorciadas regulamentadas por meio de legislações específicas em diferentes regiões. São elas a da Água Branca e Faria Lima, na Zona Oeste; Água Espraiada, na Zona Sul, e os distritos Sé e República, no Centro. Além destas, o Plano prevê a criação e regulamentação de outras três OUCs nos próximos anos, que são os Arcos Tamanduateí, Tietê e Pinheiros.

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